Por Lugares Incríveis – Afinal, Violet é egoísta?

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A Netflix lançou um filme chamado Por Lugares Incríveis, baseado na história de um livro do mesmo nome. Aqui darei um resumo do filme e uma análise do comportamento da personagem Violet.

Se preferir, esse post também está em vídeo, é só assistir abaixo pelo Youtube. Caso contrário, continue no post e leia mais.

CONTÉM SPOILERS!

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Uma das críticas negativas que li algumas pessoas na internet dizendo é que a personagem da Violet é egoísta.

A menina sofreu um acidente de carro com sua irmã mais velha, e essa faleceu. Isso gerou traumas e dificuldades sociais em Violet, que no dia do aniversário de sua falecida irmã, se encontrou em cima de uma ponte, prestes a se jogar.

Foi aí que ela conhece Finch. Um rapaz que enxerga nela “todas as cores em uma”. E vê uma oportunidade de se aproximar da garota quando seu professor de Geografia pede para que a turma faça um trabalho em duplas “por lugares incríveis” de sua cidade.

Ele insiste, e ela, que não vê nenhuma possibilidade de se enturmar com as outras pessoas, nega e tenta sair do projeto. Mas seu professor não deixa.

Daí, forçada a conviver com aquele rapaz que parece ter um bom humor e uma vontade de viver e experimentar coisas novas, ela começa a se soltar pra vida, e viver.

Porém, quando ela está se sentindo confortável com sua vida social, conseguindo enxergar beleza onde teoricamente não teria e se enturmar com outras pessoas, seu namorado, Finch, começa a sumir.

No começo é por um tempo curto e ele volta como se nunca tivesse sumido e ficado sem atender telefone ou responder mensagens. Logo, ele some por um tempo maior e depois, “para sempre”.

Ouvi muitas pessoas reclamando da personagem, que ela não se importou com ele, que ele sempre esteve ali pra ela e ela nunca se esforçou o suficiente por ele.

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Foto: IMDB/Reprodução

Mas assim, ela tinha acabado de conhecer aquele rapaz. Não sabia nada de sua vida, apenas o que ele conseguia compartilhar.

E sei bem como é difícil compartilhar seus traumas com outras pessoas, mesmo que você faça com que elas se sintam extremamente confortáveis para compartilhar os delas contigo.

Ele era fechado em relação à seus medos e aflições. Ele queria permanecer desperto, como está no post-it do quarto dele.

Fazendo uma ligação com o livro (não queria falar dele mas aconteceu), seus capítulos são sempre com a contagem de dias em que ele tem conseguido ficar desperto. E conhecer Violet o ajudou muito.

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Talvez por isso ele não quisesse mergulhar e reviver tudo que o fazia não estar desperto e focava apenas em ajudá-la e ouvi-la. Estar com ela quase o fez não se matar. Quase. Mas não era sobre ela. Era sobre ele. Mesmo em um dos melhores momentos de sua vida, não foi o suficiente.

Finch se manteve desperto o máximo que pôde. E tentou aproveitar e tirar o melhor que conseguiu. Mas se você tem transtornos, depressão e crises de ansiedade e/ou pânico, você sabe como é difícil estar vivendo até mesmo o melhor dia da sua vida, ser amado pelas melhores pessoas do mundo e ainda assim não ser capaz de não pensar em suicídio.

E você se culpa por isso.

Afinal, mesmo na melhor fase da minha vida eu não consigo deixar esse pensamento de lado. E você sabe que se falar para alguém, vão te culpar também. Afinal, você está na melhor fase da sua vida e isso não é o suficiente?

Mas quem quer se matar, também dá pistas. No livro ele mencionava o suicídio a toda hora. Vinha com fatos como “a maior parte dos suicídios acontecem X hora”. E ele também sumia (no filme mostra isso).

E Violet não se preocupava? Ela não se esforçava para entendê-lo? Ela foi egoísta e por isso ele se matou?

Não, não e não.

Quando ela entendeu os sinais com os sumiços do rapaz, no filme mostra ela indo até os amigos e a irmã de Finch, e perguntando “Ele sempre faz isso? Porque ele some? O que está acontecendo?”.

Lembrando que eles estavam no começo do relacionamento e nem sempre mostramos de cara tudo que somos.

Eu nunca… lidei com o luto! Como a série da Netflix trata tão bem o tema.

Principalmente se você tem depressão e crises pesadas. Você não quer assustar todo mundo, você acha que assim que ouvirem as palavras “depressão”, “crise”, “pânico” ou “transtorno”, todo mundo vai te abandonar porque ninguém quer levantar essa carga. Afinal, “ninguém gosta de problema”.

Quando ela conseguiu perceber os sinais que ele dava, ela perguntou pra quem estava ali perto, já que ele não estava ali para ela perguntar à ele diretamente. E todos diziam “ele é assim mesmo, daqui a pouco ele volta”.

Eu gostaria muito que no filme ela tivesse dito o que pensa no livro “Ninguém se importa com o motivo pra ele fazer isso? Vocês já pararam pra pensar que pode ter alguma coisa errada?”.

Mas ainda assim, acho que a insistência de cenas com ela perguntando onde ele poderia estar e obtendo as mesmas respostas de que ele era assim mesmo, poderia deixar claro sua preocupação com ele.

Foto: IMDB/Reprodução

O problema é que a gente percebe “tarde demais”. E aí, se Violet é egoísta, somos todos Violet em alguma relação de nossas vidas. Seja com um amigo, com um namorado, com um familiar.

Eu mesma, para perceber que minha irmã tentava suicídio e que o que ela estava passando dentro da sua cabecinha era mais sério do que eu conseguia imaginar, só aconteceu quando cheguei em casa e a peguei com uma faca em seu corpo.

Eu não era egoísta, mas eu não percebia como tudo estava transtornado dentro dela. A gente nunca acha que vai ter que lidar com uma situação dessas, ninguém nos ensina a perceber os detalhes.

Alguém triste, é só alguém triste, e isso logo vai passar. Porque mesmo com a depressão, a pessoa terá dias sorrindo muito. Mas isso não quer dizer que a depressão e a tristeza profunda não estão dentro dela. Porque estão.

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Podem ter “tirado uma folga”, mas estão ali. E a pessoa convive com aquilo, até não aguentar mais tanta oscilação de humor, tanta dor, tanta tristeza.

Eu, mesmo sabendo por tudo que minha irmã enfrentava, não consegui entender logo de cara que a situação estava insuportável para ela.

E mesmo quando eu entendi, minha família não entendia. Achavam que eu exagerava, apenas porque nunca presenciaram nenhuma cena dela em crise. Até quando testemunharam. A partir dali foi outra história.

Eu consegui ajuda para levá-la em psicólogo e psiquiatra. Eu entendi que ela precisava e consegui encaminhá-la para um tratamento. Mas por pouco eu teria entendido mas não teria mais irmã para levar para tratar.

Por pouco eu não fui taxada de egoísta, por pouco eu não fui a pessoa que nunca se esforçou para entender o que minha irmã passava.

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Entenda, todos estamos passando por algo difícil. E é comum ficarmos presos em nossas dores. Nós precisamos tratar de nossas dores.

Às vezes aparece um Finch em forma de namorado, amigo, irmão, pai, mãe, primo e nos ajuda a nos salvar. Às vezes temos que fazer isso sozinhos. Então é normal pensarmos e focarmos no que estamos passando.

E se o outro não escancara sua dor, dificilmente vamos enxergá-la. Finch mesmo só enxergou que Violet estava com problemas, por presenciar sua pessoa em cima da ponte olhando para baixo. Se não fosse isso, Violet também não seria enxergada. E alguém também seria culpado por ter sido egoísta demais.

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Foto: IMDB/Reprodução

Com isso quero dizer que precisamos tentar sempre falar o que sentimos, da forma que encontrarmos. Mas já antecipando e sabendo que não é simples, que saibamos também enxergar o outro.

Aliás, que consigamos enxergar o outro. Porque os sinais estão por toda parte, mas nunca nos foi ensinado a enxergá-los.

Muitas atitudes, como por exemplo, sumir sem dar sinal por um longo tempo, são banalizadas. “Ele sempre volta”, até não voltar mais. Enxergar que a vida da outra pessoa pode estar por um fio requer sim esforço. Ninguém tem bola de cristal, mas temos coração.

E se você acha algo estranho na atitude de alguém, tente se perguntar mais, “porque fulano age assim? será que ele é assim mesmo e ponto final?”.

Infelizmente o suicídio é mais real e está mais perto da gente, do que imaginamos.

Quando ouvimos sobre o assunto, parece uma história de contos de fadas de mau gosto e que está muito longe da nossa realidade. Mas não está não. Essas pessoas com esse pensamento são um número enorme e podem estar por um fio.

E se ela tivesse se matado, assim como Finch fez?

A vida de ninguém nos pertence. Podemos fazer tudo que estiver ao nosso alcance, mas infelizmente nunca entenderemos o que é estar na pele do outro.

Para quem fica, entender o suicídio deve ser algo insano. Eu não fui o suficiente? Eu não fiz tudo que podia? Eu não consegui ajudar?

Mas entenda, não é sobre você. Às vezes você até ajudou aquela pessoa a prolongar mais seus dias despertos, mas o caminho que leva alguém à pensar e executar sua própria morte é sombrio demais.

Por isso, quando você conseguir enxergar alguém preso na solidão, no luto, no abuso ou em tantas outras situações que causam depressão e outras doenças, entenda: não é sobre você.

Ajude pensando em como é para aquela pessoa viver aquilo, não como é para você viver aquilo e muito menos como é para você perder aquela pessoa. É duro para todo mundo.

A última coisa que uma pessoa com tendências suicidas precisa é de alguém o cobrando porque seu amor não é o suficiente para ficar vivo.

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Juliana Saueia

Juliana é atriz, escritora e bacharel em Direito. Vive com os pés na estrada e a cabeça em outros planetas.

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5 Comments

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  2. Confesso que achei “Por Lugares Incríveis” bem ruim. A vibe é muito deprê, talvez propositalmente, mas o filme peca mesmo na falta de sintonia entre o casal e de carisma de ambos protagonistas.

    1. Como toda adaptação de livros, o filme Por Lugares Incríveis realmente deixa a desejar. Para quem gosta do tema recomendo, porém, que leia o livro porque é excelente ao mostrar as nuances de um suicida.

  3. Jean Daniel twagira

    Espero que a netflix irá lançar segunda parte, porque não séria justo se terminasse daquela forma, finch não tem de morrer .. alguém terá a convencer a razão de viver por mais que seja tão diferente pela sociedade que se encontra!..

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